É preocupante a quantidade de pessoas que são vítimas do golpe do leilão falso.
Em muitas situações, são valores vultosos que são perdidos, e quase sempre, pela via administrativa, você não consegue resolver.
Pela via criminal, existe a possibilidade de identificação dos criminosos, mas a grande questão, é sobre a devolução do dinheiro em si, e o que fazer para resolver isso.
Eu acredito que o fator emocional, aliado a possibilidade de ganho rápido de dinheiro, seja o grande motivo interno desse golpe, pois ao ver uma suposta oferta incrível, é normal ficar emocionado, por isso que é necessário ter cuidado com propostas que divergem muito da prática.
Nesse texto, vou te mostrar alguns pontos, por isso eu peço que você leia com atenção.
1.Como identificar um leilão falso
Existem alguns sinais, que sinalizam a probabilidade daquele leilão ser falso, vou enumerar alguns:
1.Desconfie que quem pede pagamentos antecipados;
2.Desconfie de sites que não utilizem .com.br;
3.Verifique se a empresa tem sede física;
4.Verifique as redes sociais da empresa;
Veja se existe a possibilidade de visitação do pátio, e se possível, peça alguém de sua confiança para conferir. Você pode ate contratar um despachante na cidade para fazer isso por você, acredite, o pequeno investimento compensa a dor de cabeça futura.
2.A questão do pagamento
No momento do pagamento, sempre veja quem é o beneficiário, sempre desconfie de sujeitos que não pertencem a empresa e/ou ao leiloeiro responsável, lembrando que antes do pagamento, você tem a possibilidade de fazer essa conferência.
3.Eu caí no Golpe do Leilão Falso, por onde começar?
Considerando que você é mais uma vítima, agora vou te falar o procedimento a ser feito na busca dessa resolução.
O primeiro passo é ir até a Delegacia de Polícia e registrar o Boletim de Ocorrência, levando toda a documentação do golpe, como prints, comprovante de pagamento, o suposto termo de arrematação, pois isso que você sofreu é um estelionato, além da possibilidade da existência de outros crimes.
Se o pagamento tiver sido via TED, o segundo passo é reclamar na plataforma www.consumidor.gov.br e plataforma de reclamação do Banco Central, contra o banco onde a conta do criminoso está hospedada, onde você vai apresentar uma reclamação administrativa, solicitando informações acerca a conta do criminoso, bem como informações sobre o perfil de segurança adotado pelo Banco na abertura dessa conta e se existem outras reclamações administrativas, judiciais e policiais em desfavor da mesma. Caso tenha sido via PIX, recomendo que você reclame também contra o banco pagador, no caso, o banco que enviou o dinheiro, solicitando informações acerca a quantidade de notificações de infrações da chave que você enviou o dinheiro.
É sabido que o banco, em regra, nega essa informação, mas saiba que ela é de suma importância para a instrução do processo judicial.
Após as reclamações, dependendo da resposta, você deve procurar o seu advogado de confiança.
4.Existe alguma base legal para responsabilização dos Bancos?
Em demanda de golpe, a responsabilização do Banco acontece quando existe o descumprimento de alguma norma, como alguma Resolução do órgão controlador, no caso, o Banco Central.
Assim, ocorrendo o descumprimento de alguma norma, entendo que deverá incidir a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça, que informa:
“as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”
Sobre as Resoluções, vou citar algumas logo abaixo.
A Resolução CMN (Conselho Monetário Nacional) n° 4.949 de 30/9/2021, leciona sobre princípios e procedimentos a serem adotados no relacionamento com clientes e usuários de produtos e de serviços.
A Resolução disciplina os objetivos dos integrantes do Sistema Bancário, vide:
Art. 2º As instituições de que trata o art. 1º, no relacionamento com clientes e usuários de produtos e de serviços, devem conduzir suas atividades com observância de princípios de ética, responsabilidade, transparência e diligência, propiciando a convergência de interesses e a consolidação de imagem institucional de credibilidade, segurança e competência.
E aqui, chamamos atenção para o dever de segurança, vide:
Art. 4º As instituições de que trata o art. 1º, na contratação de operações e na prestação de serviços, devem assegurar:
(…)
II – integridade, conformidade, confiabilidade, segurança e sigilo das transações realizadas, bem como legitimidade das operações contratadas e dos serviços prestados;
(…)
V – identificação dos usuários finais beneficiários de pagamento ou transferência em demonstrativos e extratos de contas de depósitos e contas de pagamento pré-paga, inclusive nas situações em que o serviço de pagamento envolver instituições participantes de diferentes arranjos de pagamento;
(…)
Além do dever de segurança, os entes que integram o sistema bancário, devem proceder a correta identificação e qualificação dos seus usuários, como se verifica do artigo abaixo:
Art. 7º As instituições de que trata o art. 1º devem assegurar a consistência de rotinas e de procedimentos operacionais afetos ao relacionamento com clientes e usuários, bem como sua adequação à política institucional de relacionamento de que trata o art. 6º, inclusive quanto aos seguintes aspectos:
I – identificação e qualificação de clientes e de usuários para fins de início e manutenção de relacionamento;
II – concepção de produtos e de serviços;
III – oferta, recomendação, contratação ou distribuição de produtos ou serviços;
IV – requisitos de segurança afetos a produtos e a serviços;
Já a RESOLUÇÃO BCB Nº 142, DE 23 DE SETEMBRO DE 2021, informa sobre obre procedimentos e controles para prevenção de fraudes na prestação de serviços de pagamento a serem adotados pelas instituições financeiras, demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e instituições de pagamento integrantes do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB).
Art. 1º Esta Resolução dispõe sobre procedimentos e controles para prevenção de fraudes na prestação de serviços de pagamento a serem adotados pelas instituições financeiras, demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e instituições de pagamento integrantes do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB).
Art. 2º As instituições referidas no art. 1º, na prestação de serviços de pagamento, devem estabelecer:
I – limite máximo de R$1.000,00 (mil reais), por conta de depósitos ou de pagamento pré-paga, para o valor total das transações de pagamento realizadas no âmbito de um mesmo arranjo de pagamento no período das vinte horas às seis horas entre clientes pessoas naturais distintas, exceto empresários individuais; e
II – prazo mínimo de vinte e quatro horas para a efetivação do aumento de limites para transações de pagamento a pedido do cliente, formalizado nos canais de atendimento eletrônicos disponibilizados pela instituição.
§ 1º As transações de pagamento citadas no caput contemplam:
I – transações realizadas no âmbito de arranjos de pagamento de transferência com emprego de instrumentos de pagamento com função que permita a movimentação de:
a) contas de depósitos; ou
b) contas de pagamento pré-pagas;
II – transferências entre contas na própria instituição;
III – Transferência Eletrônica Disponível (TED);
IV – transação de pagamento instantâneo (Pix);
V – transferências por meio de Documento de Crédito (DOC); e
VI – boletos de pagamento.
(…)
Art. 4º As instituições mencionadas no art. 1º devem manter registros diários detalhando as ocorrências de fraudes ou de tentativas de fraude na prestação de serviços de pagamento, discriminando inclusive as medidas corretivas adotadas.
Já a Resolução BCB 4753 de 26 de setembro de 2019, leciona sobre a abertura, a manutenção e o encerramento de conta de depósitos
Art. 2º As instituições referidas no art. 1º, para fins da abertura de conta de depósitos, devem adotar procedimentos e controles que permitam verificar e validar a identidade e a qualificação dos titulares da conta e, quando for o caso, de seus representantes, bem como a autenticidade das informações fornecidas pelo cliente, inclusive mediante confrontação dessas informações com as disponíveis em bancos de dados de caráter público ou privado.
§ 1º Considera-se qualificação as informações que permitam às instituições apreciar, avaliar, caracterizar e classificar o cliente com a finalidade de conhecer o seu perfil de risco e sua capacidade econômico-financeira.
(…)
§ 4º As informações de identificação e de qualificação dos titulares de conta de depósitos e de seus representantes, quando houver, devem ser mantidas atualizadas pelas instituições.
Existem mais algumas Resoluções que são aplicáveis ao tema, mas não vou me alongar nesse tópico.
5.Como a Justiça vem decidindo
Antes de passar para os julgados, entenda que cada caso é um caso, que merece atenção e análise por parte do profissional, e sendo honesto, de todos os processos que eu verifiquei, o Banco somente foi condenado quando ele não demonstrou que cumpriu a legislação à risca, portanto, cuidado com a generalização do tema, que é delicado.
Nesse caso, o consumidor ganhou e o Banco foi condenado.
RESPONSABILIDADE CIVIL. Incidência do CDC. Consumidor por equiparação. Aquisição de motocicleta em site falso de leilões on line. Causa de pedir da demanda que reside na eventual desídia, falha na prestação de serviços do banco no tocante à prova de idoneidade do cliente no ato da abertura da conta corrente. Inteligência da Resolução nº 4.753/2019 do BACEN que revogou a Resolução nº 2.025/1993. Falta de exibição dos documentos que tornou incontroversos os fatos alegados pelo autor. Circunstância que se insere no risco da atividade exercida. Com fundamento nos artigos 14, caput, do CDC e 927, parágrafo único, do Código Civil, a instituição financeira bancária deve reparar o dano apontado nos autos. RECURSO NÃO PROVIDO.
(TJ-SP – RI: 00129500320208260564 SP 0012950-03.2020.8.26.0564, Relator: Eduarda Maria Romeiro Corrêa, Data de Julgamento: 23/03/2022, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: 23/03/2022)
Nesse caso, o consumidor ganhou, mas o Banco não foi condenado, apenas o criminoso:
BANCÁRIOS – Ação de reparação de danos – Golpe do falso leilão de automóvel – Improcedência em relação ao requerido Banco Santander (Brasil) S.A. e procedência em relação ao requerido José Lopes da Silva Júnior – Correção da aplicação da excludente de responsabilidade (culpa exclusiva da vítima) em relação à instituição financeira – Negligência do autor ao deixar de verificar a idoneidade da realizadora do leilão virtual – Preço do bem ofertado muito abaixo daquele de mercado – Destinatário do valor depositado que é o responsável pelo ressarcimento do dano – Ausência de demonstração de que o requerido José Lopes da Silva Júnior tenha sido vítima do mesmo golpe aplicado contra o autor – Sentença mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 252 do RITJSP – Recursos desprovidos.
(TJ-SP – AC: 10083941020218260562 SP 1008394-10.2021.8.26.0562, Relator: Flávio Cunha da Silva, Data de Julgamento: 24/11/2022, 38ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/11/2022)
Nesse caso, o consumidor ganhou e o Banco foi condenado:
RESPONSABILIDADE CIVIL. Responsabilidade objetiva da instituição financeira por danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações financeiras. 1. Compra de veículo pelo autor em site de leiloeiro “Avilla Leilões”. Confirmada a arrematação, foi realizada a transferência via TED para a conta de Tais Regina Procópio Souza Avilla -CPF 341.367.698-90, Banco Itaú, agência 0718, conta 27299-0, no valor de R$ 45.570,00. 2. No dia seguinte, o autor verificou em sua conta corrente no Banco do Brasil que a TED tinha sido devolvida. 3. Pouco depois, o autor recebeu uma ligação de pessoa da “Avilla Leilões”, que se identificou como Caroline, dizendo ser do financeiro e que o TED tinha que ser refeita no CNPJ n. 33.255.713/0001-55 e, não no CPF 341.367.698-90. 4. Pouco depois da transferência, percebeu que seu nome foi bloqueado e que tinha sido vítima de golpe. 5. Reconhecimento por parte do Banco Itaú S/A de que a abertura de conta-corrente se deu mediante fraude. 6. As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros – como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos – porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno”. 7. Inteligência da Súmula nº 479 do STJ. 8. Procedência do pedido para condenar a leiloeira e o Banco Itaá S/A a promoverem o reembolso da quantia de R$ 45.570,00, devidamente atualizada e com juros. 9. Sentença mantida por seus próprios fundamentos, servindo a súmula de acórdão na forma do artigo 46 da Lei nº 9.099/95. 10. Negado provimento ao recurso. Verba honorária arbitrada em 10% sobre o valor da condenação.
(TJ-SP – RI: 10020430620198260428 SP 1002043-06.2019.8.26.0428, Relator: Gilberto Luiz Carvalho Franceschini, Data de Julgamento: 19/10/2020, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: 21/10/2020)
Ou seja, o processo nesse tema, envolve uma análise aprofundada do fato.
7.Conclusão
O grande fator que difere o processo bem-sucedido, daquele que não teve êxito, é a ocorrência de alguma omissão por parte do Banco, e existe um método para identificar isso antes do processo.
É interessante pontuar, que não existe “causa ganha” ou processo com certeza de vitória, o profissional que te promete isso, além de ser desonesto com você, não age com a boa ética, por isso, caso você precise de um profissional, faça uma análise do conjunto da obra, para saber se aquele profissional tem o conhecimento do direito material do assunto tratado e tem ética na relação entabulada.
Aqui no Escritório Geofre Saraiva Sociedade Individual de Advocacia, temos uma equipe com expertise de atuação no direito bancário e estamos prontos para os desafios que virão.
Geofre Saraiva Neto
OAB/PI 8274 | OAB/SP 487426
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